Da sala de aulas em Maputo, Moçambique, aos escritórios de 14 países africanos, Tânia Macaneta construiu uma carreira que espelha a força, o talento e a visão estratégica da nova geração de líderes da comunicação em África. Hoje, à frente do marketing e comunicação para as subsidiárias africanas do Access Bank PLC, Tânia representa uma trajectória de crescimento que transcende fronteiras, marcada pela capacidade de unir culturas, alinhar propósitos e fortalecer marcas com autenticidade e impacto. Nesta entrevista exclusiva à Revista COMARP, Tânia partilha os bastidores da sua jornada, os desafios da integração de marcas em contextos multiculturais e a sua visão sobre o futuro da comunicação no continente.
Revista COMARP (RC): Fale-nos da sua trajectória académica e o que despertou em si o interesse pelo marketing e pela comunicação, e como essa paixão evoluiu ao longo da sua carreira?
Tânia Macaneta (TM): A minha jornada académica começou com uma Licenciatura em Gestão de Empresas pelo Instituto Superior de Ciências e Tecnologias de Moçambique (ISCTEM), onde descobri, quase por acaso, a minha verdadeira paixão. Durante o curso, uma das cadeiras que mais me marcou foi Introdução ao Marketing e Pesquisas de Mercado. Foi ali que percebi que o marketing não é apenas sobre vender produtos, mas sim sobre compreender pessoas, as suas motivações, desejos e comportamentos. Essa descoberta despertou em mim uma curiosidade profunda e um entusiasmo que continuam até hoje.
Tive o privilégio de ser orientada por um professor que foi determinante nesta trajectória, o professor Ivan Williams. Ele não só me ensinou as bases da comunicação e do marketing, como também me inspirou a olhar para esta área como uma forma de criar impacto positivo, de contar histórias que tocam pessoas e de construir marcas que fazem a diferença.
Mais tarde, decidi apostar no Mestrado em Gestão de Empresas pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM), o que me deu uma visão mais estratégica sobre como o marketing se integra ao propósito e à sustentabilidade dos negócios.
O meu percurso profissional começou há 14 anos, quando ainda fazia o meu segundo ano da faculdade, num programa de estágio na DDB Moçambique, e posso dizer que foi ali que a teoria ganhou vida. Trabalhar directamente com marcas, compreender as suas necessidades e ver como a comunicação pode realmente transformar percepções foi algo inspirador. A cada projecto, percebia que o marketing tem o poder de unir pessoas e de dar voz a ideias que movem o mundo.
Desde então, essa paixão só cresceu. Hoje, vejo o marketing não apenas como uma profissão, mas como uma missão, uma forma de conectar propósito, criatividade e estratégia para gerar impacto real nas pessoas e nas comunidades.
“…. Há experiências que se destacam com um significado especial. Um dos momentos mais marcantes da minha carreira foi a implementação do Access Bank no mercado moçambicano. Foi um desafio, pois tratava-se de construir uma marca do zero, num período particularmente complexo…”
RC: Ao olhar para os seus anos de experiência, quais foram os momentos ou projectos que considera mais marcantes na sua jornada profissional?
TM: Trabalhar com marketing tem sido, para mim, uma verdadeira roleta russa cheia de altos e baixos, desafios e conquistas. É uma área dinâmica, exigente e, ao mesmo tempo, profundamente gratificante. Por isso, é até difícil identificar um único momento como “o mais marcante”, porque acredito que todos, sejam eles bons ou maus, contribuíram de forma decisiva para a profissional que sou hoje. Cada projecto, erro, acerto foi uma oportunidade de aprendizagem e crescimento.
Ainda assim, há experiências que se destacam com um significado especial. Um dos momentos mais marcantes da minha carreira foi a implementação do Access Bank no mercado moçambicano. Foi um desafio, pois tratava-se de construir uma marca do zero, num período particularmente complexo, em plena pandemia de COVID-19 e logo a seguir, gerir a aquisição do BancABC. Esse processo exigiu uma enorme dose de resiliência, criatividade e capacidade de adaptação, mas também reforçou em mim a convicção de que o marketing é, acima de tudo, sobre pessoas, propósito e visão.
Outro marco importante foi o rebranding do FNB Moçambique, um projecto que me permitiu compreender profundamente o poder da identidade de marca e da consistência na comunicação. Foi inspirador ver como uma mudança bem estruturada de imagem pode fortalecer a ligação de uma marca com os seus clientes e colaboradores.
Esses momentos representam a capacidade de se reinventar, transformar desafios em oportunidades e criar valor mesmo em tempos de incerteza. Cada projecto reforçou em mim o compromisso de continuar a aprender, evoluir e contribuir para um marketing mais estratégico, humano e relevante para o mercado moçambicano.
RC: Como foi participar directamente no rebranding do FNB em Moçambique? Que lições essa experiência lhe trouxe sobre gestão de marca e adaptação ao contexto local?
TM: Participar directamente no processo de rebranding do FNB Moçambique foi uma das experiências mais gratificantes e enriquecedoras da minha carreira. Reposicionar uma marca dessa dimensão vai muito além de mudar um logótipo ou renovar a identidade visual. Trata-se de um processo profundo de transformação organizacional, que envolve tanto o público externo quanto o interno.
No plano interno, o desafio passou por garantir que todos os colaboradores compreendessem e abraçassem essa nova fase da marca. Era essencial que cada um se sentisse parte da mudança, para que a transição fosse fluida e autêntica aos olhos dos clientes. Isso implicou alinhar equipas, actualizar todos os materiais de comunicação e transformar visualmente os balcões, sempre com foco na coerência da mensagem e na experiência do cliente.
No plano externo, o trabalho foi igualmente desafiador e empolgante. Desenvolvemos campanhas e elementos de comunicação capazes de conectar emocionalmente o público à nova imagem, transmitindo não apenas uma mudança estética, mas uma verdadeira evolução na proposta de valor. O rebranding veio acompanhado de melhorias concretas nos produtos e serviços, como o lançamento de um website totalmente reformulado, bem como soluções inovadoras de internet e mobile banking, que reforçam a modernidade e a proximidade da marca com os seus clientes.
Essa experiência ensinou-me que o sucesso de um rebranding não está apenas na nova cara da marca, mas na forma como conseguimos preservar a sua essência enquanto a tornamos mais relevante e adaptada ao contexto local.
RC: Por outro lado, trabalhar com marcas como Standard Bank, HCB e EDM deve ter trazido desafios únicos. O que aprendeu com essa diversidade de sectores?
TM: Trabalhar com marcas tão distintas como o Standard Bank, a HCB e a EDM foi, sem dúvida, uma das experiências mais enriquecedoras da minha carreira. Cada uma delas representa um universo próprio com diferentes culturas organizacionais, públicos e desafios de comunicação, o que permitiu-me crescer muito enquanto profissional.
No caso do Standard Bank, pude compreender de perto como uma marca global se adapta a um contexto local, equilibrando o peso da tradição e da reputação internacional com as especificidades e as dinâmicas do mercado moçambicano. Já com a HCB e a EDM, aprendi o valor e a responsabilidade de comunicar grandes marcas nacionais e estatais, onde a comunicação vai muito além da promoção. Trata-se de construir confiança, credibilidade e impacto social.
Essa diversidade de sectores ensinou-me a importância da empatia, da escuta activa e da adaptação estratégica. Cada marca tem o seu propósito e a sua forma de se conectar com o público, e cabe a nós, profissionais de marketing e comunicação, encontrar as melhores formas de traduzir essa essência em mensagens autênticas e relevantes.
Acima de tudo, considero um privilégio ter podido navegar por mundos tão diferentes e, em cada um deles, contribuir para gerar valor.
“Precisávamos comunicar que o BancABC deixava as suas actividades em Moçambique, mas que, em seu lugar, chegava uma marca africana sólida, com um vasto know-how e uma bagagem internacional capaz de fortalecer ainda mais o sector financeiro nacional.”

RC: A integração do Access Bank após a aquisição do BancABC foi um marco importante no sistema financeiro nacional. Qual foi o maior desafio deste processo do ponto de vista de comunicação e marketing?
TM: A integração do Access Bank após a aquisição do BancABC foi, sem dúvida, um dos maiores desafios da minha trajectória em comunicação e marketing. Tratava-se de um momento muito sensível, pois o BancABC era uma marca com forte presença e reconhecimento no mercado moçambicano, e era essencial garantir que o público compreendesse esta transição de forma positiva e confiante.
O grande desafio foi, portanto, gerir a percepção e a confiança do cliente. Precisávamos comunicar que o BancABC deixava as suas actividades em Moçambique, mas que, em seu lugar, chegava uma marca africana sólida, com um vasto know-how e uma bagagem internacional capaz de fortalecer ainda mais o sector financeiro nacional.
Quando o Access Bank entrou no mercado, ainda era uma marca pouco conhecida localmente. Por isso, antes mesmo de promover produtos ou serviços, foi necessário realizar um trabalho profundo de posicionamento e educação de marca: apresentar quem é o Access Bank, de onde vem, a sua presença em África e no mundo e, sobretudo, o valor que traria para Moçambique.
Esse processo exigiu uma comunicação estratégica, transparente e consistente centrada em construir confiança e credibilidade junto aos clientes, colaboradores e stakeholders.
“Trabalhar com equipas de diferentes países tem-me ensinado muito sobre empatia, colaboração e escuta activa. Aprendemos diariamente uns com os outros e percebemos que, quando há uma visão clara e partilhada, as diferenças tornam-se uma força.”
RC: Hoje, lidera a área de marketing e comunicações para 14 países africanos. Como é gerir uma comunicação multicultural e manter a coerência de uma marca pan-africana?
TM: Hoje, faço orgulhosamente parte da equipa de marketing e comunicações para os países africanos onde o Access Bank está presente, e posso dizer que tem sido uma jornada verdadeiramente enriquecedora. Gerir a comunicação de uma marca pan-africana é um exercício constante de equilíbrio entre coerência global e autenticidade local.
Para mim, o ponto de partida está em ter um profundo conhecimento da marca, compreender o seu propósito, a sua missão e os seus valores, porque é a partir desse alicerce que conseguimos adaptar a mensagem a diferentes realidades, sem perder a essência. A marca precisa falar com uma só voz, mas em vários sotaques, respeitando as nuances culturais, linguísticas e comportamentais de cada país.
Trabalhar com equipas de diferentes países tem-me ensinado muito sobre empatia, colaboração e escuta activa. Aprendemos diariamente uns com os outros e percebemos que, quando há uma visão clara e partilhada, as diferenças tornam-se uma força. Essa experiência reforça o meu orgulho em contribuir para a construção de uma marca que representa não apenas um banco, mas um verdadeiro símbolo de conexão, inclusão e crescimento em África.
RC: Quais são, na sua visão, as principais competências que um líder de comunicação e marketing precisa ter para gerir equipas e projectos em diferentes contextos culturais?
TM: Na minha visão, liderar equipas de comunicação e marketing em diferentes contextos culturais exige um conjunto de competências que vão muito além da gestão tradicional. Em primeiro lugar, é fundamental ter uma visão estratégica, que permita alinhar os objectivos globais da organização com as particularidades de cada mercado local.
A empatia e a escuta activa são igualmente essenciais. Estamos a lidar com diferentes países, culturas e formas de pensar, e é preciso compreender que um modelo que funciona numa realidade pode não ser eficaz noutra. Por isso, a capacidade de se colocar no lugar do outro, ouvir atentamente e adaptar abordagens é decisiva.
Além disso, o conhecimento profundo dos mercados em que operamos é crucial. É através desse conhecimento que conseguimos desenhar comunicações capazes de conectar a marca com os diversos públicos, respeitando as suas especificidades, aspirações e valores.
Por fim, acredito que um bom líder deve inspirar confiança, motivar equipas e cultivar uma cultura de colaboração e aprendizagem contínua. Quando esses elementos estão presentes, conseguimos transformar a diversidade em força, e entregar resultados consistentes e relevantes para cada mercado, sem nunca perder a essência da marca.
RC: Como equilibra a necessidade de uniformizar a imagem global do Access Bank com a importância de respeitar as especificidades locais de cada país?
TM: Equilibrar a uniformidade da imagem global do Access Bank com as especificidades locais é, para mim, um exercício contínuo de harmonia entre consistência e adaptação. A marca precisa falar com uma só voz, reflectindo os seus valores, missão e identidade global, mas ao mesmo tempo deve respeitar as nuances culturais, sociais e comportamentais de cada país.
O ponto de partida é sempre ter uma base sólida de princípios e padrões globais, que guiem toda a comunicação e presença da marca. A partir daí, cada equipa local tem a liberdade de adaptar campanhas, mensagens e experiências de acordo com o contexto do seu mercado, garantindo relevância e conexão genuína com o público.
Aprendi que ouvir as equipas locais e compreender profundamente cada mercado é tão importante quanto manter a coerência global. É nesse equilíbrio — entre centralização estratégica e flexibilidade local — que conseguimos criar uma marca forte, consistente e, ao mesmo tempo, verdadeiramente conectada às pessoas que servimos em cada país.
No fundo, trata-se de transformar a diversidade em força, permitindo que a marca seja reconhecida e respeitada em todos os mercados, sem perder a sua essência ou propósito.

RC: Que estratégias de comunicação considera mais eficazes para reforçar a presença de uma marca financeira em mercados emergentes africanos?
TM: Nos mercados emergentes africanos, as estratégias de comunicação mais eficazes são aquelas que unem proximidade, autenticidade e propósito. No Access Bank, temos procurado reforçar a nossa presença através de uma comunicação que vai além dos produtos financeiros: queremos gerar impacto real nas comunidades onde operamos.
Um dos pilares dessa estratégia é o nosso forte compromisso com a sustentabilidade, que orienta tanto as nossas acções de negócio quanto a forma como comunicamos. Iniciativas de educação financeira, apoio a empreendedores locais e projectos de inclusão social têm sido fundamentais para aproximar a marca das pessoas e demonstrar o nosso papel como parceiro de desenvolvimento.
Em essência, acredito que o segredo está em equilibrar consistência global com empatia local, comunicando de forma transparente, sustentável e relevante para que o Access Bank seja reconhecido não apenas como um banco, mas como um agente de transformação positiva em África.
“Acredito que o futuro será moldado por três grandes tendências: personalização, inclusão e propósito.”
RC: A inovação digital está a transformar o marketing no sector bancário. Que tendências acredita que vão definir o futuro do marketing financeiro em África?
TM: Sem dúvida, a inovação digital está a redefinir o marketing no sector bancário africano. Acredito que o futuro será moldado por três grandes tendências: personalização, inclusão e propósito.
Em primeiro lugar, a personalização, impulsionada por dados e inteligência artificial permitirá que os bancos compreendam melhor o comportamento dos clientes e ofereçam experiências e comunicações mais relevantes e humanas. No Access Bank, já estamos a investir fortemente em soluções digitais que permitem criar jornadas personalizadas e simplificadas, como o AccessMore App implementado em várias subsidiárias africanas, que combina conveniência, segurança e uma experiência centrada no cliente.
A segunda tendência é a inclusão financeira digital. Em muitos mercados africanos, o acesso a serviços financeiros continua a ser um desafio, e o digital é a ponte que aproxima as pessoas do sistema bancário. O marketing tem aqui um papel essencial: educar, inspirar confiança e demonstrar valor real na vida das pessoas.
Por fim, vejo a sustentabilidade e o propósito social como motores de diferenciação das marcas financeiras. O futuro do marketing não será apenas sobre vender produtos, mas sobre construir confiança e impacto.
RC: O Access Bank tem mostrado compromisso com a sustentabilidade e responsabilidade social. De que forma a comunicação e o marketing podem contribuir para fortalecer essa agenda?
TM: No Access Bank, sustentabilidade e responsabilidade social são parte central da nossa estratégia. O marketing e a comunicação ajudam a dar visibilidade a essas acções, mostrando o impacto real na vida das pessoas e nas comunidades.
Através de campanhas sobre inclusão financeira, empreendedorismo e educação, conseguimos transformar iniciativas estratégicas em histórias que conectam e inspiram. A comunicação fortalece a reputação da marca, mobiliza colaboradores, clientes e mostra que é possível crescer de forma responsável e sustentável.
“O conselho que deixo aos jovens que aspiram construir uma carreira sólida em marketing e comunicação é simples, mas poderoso: façam sempre o vosso melhor, mesmo quando ninguém está a olhar. Busquem aprender continuamente, actualizar-se e evoluir as vossas competências, porque o mundo do marketing é dinâmico, e aqueles que não se mantêm “on track” correm o risco de ficar para trás.”
RC: Que conselhos deixaria para jovens profissionais que aspiram construir uma carreira sólida em marketing e comunicação em Moçambique e além-fronteiras?
TM: Durante a minha jornada, especialmente no início, quando ainda era estagiária, esforçava-me sempre para dar o meu melhor, mesmo nos momentos em que sentia que o meu trabalho passava despercebido. Lembro-me de um dia em que o meu primeiro chefe me disse: “Well done, Tânia, estás no bom caminho”. Esse reconhecimento foi transformador e mostrou-me o valor da persistência e do esforço constante.
O conselho que deixo aos jovens que aspiram construir uma carreira sólida em marketing e comunicação é simples, mas poderoso: façam sempre o vosso melhor, mesmo quando ninguém está a olhar. Busquem aprender continuamente, actualizar-se e evoluir as vossas competências, porque o mundo do marketing é dinâmico, e aqueles que não se mantêm “on track” correm o risco de ficar para trás.
Acredito que a paixão, a dedicação e a vontade de aprender são os pilares que permitem não só crescer profissionalmente em Moçambique, mas também construir uma carreira sólida além-fronteiras.